Brasília – Parlamentares da base aliada de vários partidos que participam das mobilizações dos trabalhadores de estatais contra o Projeto de Lei do Senado (PLS) 555 no Congresso receberam a confirmação hoje (1º) de que o Palácio do Planalto está empenhado em negociar com as lideranças da base e da oposição pontos de consenso no texto, de forma a mudar o seu teor e evitar danos para essas empresas públicas. A novidade, no entanto, não reduz a organização de centrais e sindicatos de dezenas de categorias, cujos manifestantes estão desde ontem em Brasília e pretendem dar continuidade às reuniões nos gabinetes e aos atos de convencimento aos senadores sobre os riscos do teor da matéria para o país.
O PLS 555 tem sido criticado por estabelecer a chamada Lei de Responsabilidade das Estatais e abrir brechas para a privatização. A ideia, segundo um líder partidário, é de o Executivo formalizar seu apoio ao pleito sindical, por meio de contatos com o Comitê de Defesa das Empresas Públicas, o chamado Comitê de Defesa das Estatais - responsável pela coordenação da mobilização.
Ao mesmo tempo, está sendo negociado o adiamento da votação para o assunto ser melhor discutido. Até agora, no entanto, não houve confirmação sobre o adiamento da votação, que pode ocorrer entre hoje e amanhã (a base aliada espera que seja postergada para as próximas duas semanas).
As articulações que estão sendo feitas, agora com a participação do Palácio do Planalto, contam tanto com abordagens ao autor do substitutivo original, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), como com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), uma vez que foi Renan quem incluiu a matéria na pauta desta semana. Mas como a pauta do plenário do Senado está trancada por duas medidas provisórias, os parlamentares contrários à matéria apostam em novos atrasos.
Negociação dos textos
Uma das alternativas a ser negociada é a junção de itens do substitutivo de Jereissati com o substitutivo elaborado pelos representantes dos trabalhadores, que foi protocolado na Casa duas semanas atrás pelo senador Roberto Requião (PMDB-PR). Caso não haja consenso nos entendimentos que estão em curso, os senadores terão de decidir em plenário, antes da apreciação da matéria, qual dos dois substitutivos vão optar por votar.
Na mobilização de hoje, o ato público que estava programado para se realizar no auditório Petrônio Portela foi transferido para a sala da Comissão de Direitos Humanos do Senado, porque a entrada dos participantes foi barrada no auditório. O impedimento não atrapalhou a mobilização dos trabalhadores – que debateram sobre os riscos do projeto privatista, ao lado de senadores e deputados que apoiam o movimento.
O ato contou também com a presença dos senadores Paulo Paim (PT-RS), Lindberg Farias (PT-RJ), Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), Fátima Bezerra (PT-RN), Regina Sousa (PT-PI) e Hélio José (PMB-DF), bem como a deputada federal Erika Kokay (PT-DF). Também foram discutidas estratégias para buscar mais adesões entre os parlamentares.
Nesta tarde, o grupo se dividiu para conversar nos gabinetes com vários deputados e senadores. “Temos a adesão de pouco mais de 30 senadores, de um total de 81, e precisamos de mais para barrar o projeto”, contou a coordenadora do Comitê Nacional em Defesa das Empresas Públicas, Maria Rita Serrano, ao comentar que apesar das informações sobre acordo por parte do governo com o autor do substitutivo, o comitê ainda não recebeu informação concreta a respeito.
Já anunciaram que se opõem ao PLS 555 senadores e deputados do PT, PCdoB, Rede, PDT, PMB e PMDB – nesse último caso, o senador Roberto Requião (PR).
Estatuto das estatais
O texto que resultou no PLS 555 começou a ser discutido a partir de uma revisão da Lei de Responsabilidade Fiscal, para que fosse instituída, à parte, o chamado “Estatuto das Estatais”. Acontece que o relatório sobre a matéria terminou sendo considerado uma espécie de ‘monstro privatista”, conforme chamou o engenheiro Marcondes Faria, da Codevasf, presente ao ato público do Senado.
“Abordando vários aspectos de forma genérica, o projeto simplesmente muda radicalmente a composição dos conselhos destas estatais, permite o ingresso de pessoas não concursadas nos quadros e tem vários itens que, na verdade, consistem numa reversão total do atual modelo de Estado que temos hoje”, reclamou.
“O PLS 555 traz, em primeiro lugar, um vício de iniciativa, uma vez que trata de um assunto relativo à organização do Poder Executivo. Portanto, invade prerrogativas da Presidência da República”, explicou, também, o consultor do Senado Luiz Alberto dos Santos, especialista em políticas públicas e gestão governamental.
“Além disso, é um texto que apresenta abrangência geral sobre o tema e definições superficiais sobre a função social que possuem hoje essas empresas públicas. Como se não bastasse, o texto limita a composição dos órgãos societários e, se for aprovado, levará as estatais a passarem por um período de transição marcado por gastos onerosos para recompra de ações”, acrescentou Santos.
Discriminação sindical
Os integrantes do comitê pretendem explicar, ainda, os pontos críticos da carta apresentada por eles ao Senado no início de fevereiro, na qual destacam a exigência contida no PLS de que as estatais se transformem em sociedades anônimas; mudança na composição acionária (venda de ações) e critérios rígidos para composição da direção e de conselhos. Além de itens considerados discriminação sindical e política – evitando que esses representantes ou mesmo filiados a partidos se tornem conselheiros.
Também são acentuados como itens negativos do projeto, que causarão danos ao país, uma emenda do senador José Serra (PSDB-SP) – que não integra o texto, mas poderá ser incluída à matéria – que possibilita a abertura de exceção nessas empresas para contratação sem concurso público e a abertura de possibilidade para que, dentro dos critérios para composição dos conselhos dessas companhias, até 25% dos conselheiros sejam indicados de forma independente, sem esclarecimentos sobre como seria essa “independência”, ou os critérios para tal.